Ciclistas Vermelhos na Itália

A bicicleta frequentemente foi considerada como um meio de transporte "suspeito" ou mesmo subversivo, e tem sido por muito tempo objeto de proibições. De fato, este veículo, inventado em 1817 e, em sua versão atual em 1884, foi no início um veículo chique, caro e, portanto, elitista, reservado para a classe alta que o usava para o tempo livre.

Os primeiros ciclistas
Na Itália, os primeiras velocípedes apareceram em 1860, montados por extravagantes nobres e pessoas da classe alta que despertavam a curiosidade e o medo dos transeuntes (Fontana).
Em 1869, o prefeito de Milão proibiu absolutamente "o uso de velocípedes em toda a área da cidade fechada dentro do círculo dos Navigli" porque "a circulação de velocípedes pode ser perigosa para as pessoas que os usam, como para o público". Além das razões de segurança, outros prefeitos explicaram as proibições com o fato de que "a máquina é assustadora, mesmo quando vista de longe"
(Pivato, 1992).
O velocipede não era acessível para as classes mais baixas que não tinham tempo para gastar em diversões, sem mencionar que o preço de compra de uma bicicleta Adler, Neumann, Swift (a favorita de Italo Svevo) ou Prinetti Stucchi era igual à retribuição anual de um trabalhador, e que também havia um imposto a pagar por isso, para obter um selo para fixar no quadro por um anel de metal, cuja falta gerava sanções
(Lombroso). No início o imposto era municipal, o valor era de 12 liras em Milão e 6 em Roma; depois, em 1897, a Câmara dos Deputados aprovou uma lei estabelecendo um imposto de 10 liras para bicicletas simples e 15 liras para tandens, equivalente ao imposto de hoje para um carro de tamanho médio, e que mesmo empurrava alguns a roubar o selo.
O governo prometeu demoradamente a abolição deste imposto. Antonio Vicini, deputado de Modena, que na época pertencia à extrema esquerda, na sessão de 14 de dezembro de 1907 da Câmara dos Deputados declarou: “Não há razão para que por um objeto que custa 90 ou 100 liras é preciso pagar, como na Itália, um imposto que represente uma verdadeira agiotagem
(Tarantini). Em 1909, o Parlamento reduziu o imposto para seis liras, especialmente sob pressão do Touring Club, que previa uma maior difusão da bicicleta (Pivato, 1992).
Caçoando do imposto sobre as bicicletas, Lorenzo Stecchetti (Olindo Guerrini, 1845-1916) escreveu: "Não vai demorar muito que, pela vontade soberana, você vai ter um medidor entre os joelhos e um selo no rabo"
(Pivato, 1992).

As forças políticas populares e revolucionárias no início eram fortemente hostis a este veículo, e ainda mais ao esporte de ciclismo. Em 23 de junho de 1894, o escritor Alfredo Oriani, autor, entre outras obras, do livro de 1902 "Bicicletta", inspirado na sua viagem da Romanha para a Toscana com uma Bremiamburg de roda fixa, e da obra sobre a bicicleta "Sul pedale" ("Sobre o Pedal"), (ligação, em italiano), participou em Faença numa manifestação contra a ordenança do prefeito de 6 de junho, proibindo os "velocipedistas" de entrar na cidade de bicicleta. Os setenta ciclistas foram recebidos pelos cidadãos de Faença com vaias e apupos hostis e só conseguiram deixar a cidade até tarde da noite, escoltados por cavaleiros ligeiros (Dirani e L'Osservatore romano).
Nos Touring club, a bicicleta tornou-se uma ferramenta para o turismo, capaz de realizar o desejo das classes burguesas e populares de participar do tempo livre
(Pivato, 1992). Em 8 de novembro de 1894, foi fundado em Milão o Touring Club Ciclistico Italiano, que desde 1900 será chamado Touring Club Italiano, nascido para proteger os ciclistas que não eram membros de nenhum clube esportivo. Embora o clube fosse apolítico, de acordo com o seu estatuto, apoiava reivindicações territoriais nacionalistas, com "viagens patrióticas" em áreas de cultura italiana, mas pertencentes a outros estados, como Nice, Saboia, Cantão do Ticino, Trentino, Alto Ádige, Karst e Trieste (Sbetti).
Os círculos de ciclistas irredentistas, reivindicando recuperar Friul-Veneza Júlia, Trentino, Ístria e Dalmácia do domínio austro-húngaro, foram difundidos nessas áreas, e organizaram viagens nas quais atravessaram vilas, onde foram acolhidos pela população com canções patrióticas, com grande preocupação das autoridades austro-húngaras. Também a escolha de bicicletas teve uma motivação patriótica, preferindo as italianas Bianchi, Gerbi ou Panzera às austro-alemãs Adler, Pearl ou Waffenrad
(Pivato, 1992).
A rainha Margherita foi o primeiro membro da casa real a ingressar no Touring Club italiano, e adorava andar nas avenidas da Vila Real de Monza em sua bicicleta Bianchi de aço. Margherita aprendeu a andar de bicicleta por Edoardo Bianchi, o fundador da empresa de fabricação de bicicletas. O exemplo da rainha envolveu muitas damas aristocráticas da sua corte
(Gori).
Em Rimini, em 1896, iniciou-se um debate político sobre os problemas e os acidentes causados pelos velocipedistas, e também se propôs estabelecer uma licença, a ser obtida por meio dum exame de qualificação, perante uma comissão designada pelo prefeito "para evitar que os não expertos circulassem nas ruas", em seguida substituído por uma declaração juramentada. O conselho administrativo da província, no entanto, considerou ilegal a imposição de um imposto rodoviário
(Pivato, 1992).

Nesses anos, uma guia turística do Touring Club Italiano aconselhava aos ciclistas para evitar passarem pela Emília Romanha e, em particular, por Ímola, na província de Bolonha e Faença, na província de Rávena, para não sofrer atos de vandalismo, sendo o ciclismo considerado como uma atividade da classe alta e, portanto, hostil à classe trabalhadora (Fontana). Inicialmente, tanto os republicanos como os anarquistas estavam contra o ciclismo. Após a primeira edição do Giro d'Italia (a Volta à Itália de ciclismo) que desenvolveu-se em 1909, o jornal republicano "La Giovane Italia" chamou o Giro de "uma vergonha que desonra o povo da Itália", enquanto o republicano Arturo Camprini queixou-se de que em quase mais de meia hora, ele viu vender 500 cópias do Gazzetta dello Sport, enquanto em 5 dias apenas foram vendidas 10 cópias de "La Giovane Italia" (Pivato, 1992). Um folheto do início da década de 1910, assinado por "Os jovens Socialistas, Mazzinianos e Anarquistas", intitulado: "Deplorem o esporte!" arremetia contra o esporte competitivo, diferente do que é «nnobremente voltado para o maravilhoso progresso científico» ou é «instrumento de diversão e entretenimento», que não poderia ser reprovado «sem incorrer na acusação de ser inimigo do progresso e da melhoria humana». O folheto, por outro lado, condenava «o esporte, que, com seu atrativo de uma fama repentina e com a lisonja dum ganho imediato devido o primeiro a uma avaliação mal-entendida dos valores humanos, devida a segunda a alvos da vulgar especulação, distrai tantas preciosas energias juvenis de intentos sem dúvida diferentes, de intenções verdadeiramente nobres e proveitosos e de sublimes ideais, e atrai-os na sua órbita fatal, os escraviza vergonhosamente aos duvidosos objetivos lucrativos e de supremacia da classe capitalista e burguesa de especuladores e grandes industriais, jogando-as, como brutal e inconsciente instrumento publicitário, numa corrida louca e desesperada, espalhada com todo tipo de fatigas, perigos e mortes », e lamentava "o espetáculo desprezível de inconsciência e de desperdício de energia que todos estos jovens ciclistas oferecem no Giro d'Italia", definindo-o como uma das tantas "ciladas armadas pelo atual sistema de governo plutocrático e burguês contra a credulidade inconsciente da multidão". A conclusão do panfleto era "Abaixo o esporte!" (Dirani).
O Partido Socialista italiano manteve-se por muito tempo apegado à certeza de que o esporte era uma reprodução em miniatura dos mecanismos da guerra capitalista, o que era funcional para especulações industriais ou nacionalistas e até prejudicial ao corpo. O esporte era nacionalista e clerical "uma reação muscular violenta à inatividade produtiva das classes ricas: então, a vingança da natureza contra a ociosidade e a inatividade"
(Petrini). A hostilidade dos socialistas fora dirigida principalmente contra o agonismo e a presença de classificações, vistas como opostas aos objetivos de solidariedade, de modo que as primeiras competições não incluíam classificações, e a primeira reunião da Internacional Desportiva Socialista em Ghent em 1913 discutiu da abolição de classificações e prêmios.
Além disso, o esporte alimentava o nacionalismo e o militarismo. A proximidade com o militarismo estava confirmada pelo fato de que muitas vezes os chefes das associações de ginástica eram generais, entre eles Fiorenzo Bava Beccaris, que liderou o massacre de Milão em 1898 contra protestos pelo aumento dos preços e Luigi Pelloux, primeiro-ministro, duas vezes ministro do interior e três vezes Ministro da guerra, responsável por ferozes repressões antipopulares
(Pivato, 1992). Esta posição, que provavelmente foi afetada pelas origens agrícolas do Partido Socialista, levou Benito Mussolini, naquele momento editor do "Avanti!", a declarar, em 1º de dezembro de 1912, que queria espalhar pregos pela Via Emilia no passagem dos ciclistas do Giro d'Italia (Sbetti). Os jovens socialistas definiam os participantes do Giro como "velocipedaços" e o dirigente socialista Giuseppe Zibordi descrevía o ciclista como "curvado como um ponto de interrogação em seu guidão criminoso em chifre de búfalo, ele concentra todas as suas faculdades físicas e intelectuais em seus pés" e além disso: "com efeito é certo que geralmente os corredores são apenas anormais, com um traço (muito forte) de criminosos".

O início do uso político da bicicleta
A situação mudou quando a bicicleta tornou-se um meio de transporte acessível a todos, graças à redução de preços devido à sua crescente difusão e ao avanço tecnológico. Em 1893 o preço duma bicicleta era igual a 1655 horas de trabalho, mas em 1913 eram suficientes apenas 357 (Pivato, 1992). O preço de uma bicicleta Bianchi baixou de 300 salários diários dum trabalhador no final do século XIX a 100 salários dez anos mais tarde. Um debate começou assim dentro dos partidos e das organizações de trabalhadores, entre prós e contras à prática esportiva. A secção do Partido Socialista de Ímola, em maio de 1904, promoveu uma sociedade recreativa com a convicção de que "não é um privilégio das classes burguesas poder viver fraternalmente a vida coletiva dos círculos e dos grémios" (Ridolfi).
O esporte também foi promovido como uma ferramenta para combater o alcoolismo, flagelo das classes trabalhadoras. Em 31 de agosto de 1910, a revista "Sempre Avanti!" ("Sempre Adiante!") publicou um artigo de seu editor, Francesco Paoloni, que enfatizava como o alcoolismo desumaniza e torna as pessoas insensíveis a todas as exortações ideais, enquanto "qualquer bruto menos pode ser amanhã um militante mais no exército de combate do proletariado"
(Giuntini).
Muitos revolucionários recusavam o ciclismo como esporte e a bicicleta como uma ferramenta de lazer, mas aceitavam-na como símbolo da modernidade e como meio de luta, não só para chegar ao trabalho, mas também para manter as ligações entre fábricas ocupadas, alertar os trabalhadores da chegada das forças de ordem pública, distribuir a imprensa revolucionária, alcançar e organizar trabalhadores nas aldeias mais isoladas e no campo, permitindo-lhes participar das manifestações nas cidades. Esse caráter "subversivo" de bicicleta também levou as autoridades eclesiásticas a observá-la com suspeição, considerando-a "verdadeira anarquia, comparável ao hermafroditismo" e até mesmo proibindo os sacerdotes de usá-la, sob pena de ações disciplinares, inclusive a suspensão a divinis
(Izagirre, Pivato, 2011).
Em 1910, o padre da paróquia duma aldeia perto de Ravena havia levantado uma questão no boletim paroquial: pode um padre que tem que correr urgentemente para a cabeceira duma pessoa seriamente doente "andar de bicicleta apesar da proibição superior?" e deu-se uma resposta positiva. ("Pode"). O bispo de Faenza, tendo uma opinião diferente, ordenou a apreensão do boletim, confirmando a proibição absoluta, em todas as situações, por causa da "grande dissipação que teria produzido" uma suspensão, mesmo parcial, da proibição
(Pivato, 1992). Uma pequena notícia do jornal Il Messaggero de Roma em 1894 testemunha a transição da Igreja Católica da recusa à aceitação da bicicleta.

No verão de 1894, a Associazione Milanese dei Ciclisti Socialisti (Associação Milanesa de Ciclistas Socialistas) teve como objetivo propagar as ideias socialistas e participava de corridas de bicicleta para fazer campanha a favor de Leonida Bissolati. Novamente em Milão, em 1896, os grupos “Pro Ideale” e “So-cialisti” no quinto círculo eleitoral eleitoral de Milão fizeram campanha por Filippo Turati (Senatori, 2011). Em 1898, durante os tumultos populares de Milão contra a fome, o infame general Bava Beccaris, com um anúncio, proibiu a circulação de "bicicletas, triciclos e tandem" para evitar que se tornassem num meio valioso de comunicação entre insurgentes.
Outros grupos ativos foram o "Forza e Costanza", a secção de ciclismo das cooperativas de Brescia e o "Club Ciclistico Avanti" em Roma
(Senatori, 2011). Somente graças aos ciclistas vermelhos, o quarto Congresso Nacional do Partido Socialista, realizado em Florença de 11 a 13 de julho de 1896, colocou na agenda o problema do esporte (Boschi).
Em 1900, o criminologista
Cesare Lombroso (1835-1909) terminava um de seus artigos com um parágrafo sobre os benefícios do ciclismo para o bem-estar e a civilização: «Reduziu o isolamento de pequenas cidades, colocou o campo a poucos minutos de áreas residenciais e capitais, foi um aliado nas eleições para os partidos políticos mais progressistas, que, portanto, sabem como usar os meios de luta mais modernos». Lombroso também elogiou os benefícios da bicicleta para a saúde mental e concluiu com uma frase que hoje parece decididamente otimista: «o cicloanthropos do século XX sofrerá menos de nervos, seus músculos serão mais robustos do que os do homem do século passado».
No mesmo artigo, contudo, Lombroso prevenia contra
«a extraordinária importância da bicicleta, quer como causa quer como ferramenta de crime», e citava uma ampla casuística de crimes cometidos para obter o dinheiro necessário para comprar uma bicicleta e se tornar ciclistas ou para vendê-la, ou para usar a bicicleta para escapar rapidamente após um assalto.

Os primeiros Ciclistas Vermelhos
No novo século, o uso político organizado da bicicleta teve um forte desenvolvimento em Emília e Romanha, onde os republicanos, que no momento e até o segundo período pós-guerra eram uma força política radical e anti-clerical, organizaram em 26 de julho de 1903 em Cervia seu primeiro simpósio regional de ciclismo, com a participação de delegados das Marcas, para enfatizar a importância da bicicleta para a difusão de idéias revolucionárias de Giuseppe Mazzini. Uma convenção dos republicanos das Marcas e Romanha, realizada na República de San Marino em agosto de 1904, teve grande ressonância na imprensa (Pivato, 1992).
Em 12 de junho de 1905, por iniciativa dos socialistas de Régio da Emília, foi fundado o primeiro grupo de ciclistas vermelhos: em frente à Cooperativa de Prato di Correggio, reuniram-se as equipes de ciclismo de Reggio, Bagnolo, Correggio, Rubiera e San Martino in Rio. O encontro foi promovido pela Câmara de Trabalho local para colocar ao serviço dos trabalhadores "um meio rápido de conversa para as grandes batalhas dos trabalhadores". A iniciativa foi um grande sucesso, e logo depois foi estabelecida a Associação Provincial de Ciclistas Vermelhos, declarando: "A bicicleta que já se tornou uma ajuda útil para o trabalhador individual também deve se tornar uma ajuda poderosa para a ação coletiva no interesse das massas proletárias"
(Pivato, 1992).
Em 10 de abril de 1906, em Carpi, na província de Modena, foi fundada a Unione Sportiva Socialista (União Esportiva Socialista), aberta aos membros do Partido Socialista tendo em sua posse uma bicicleta, com o objetivo de
«beneficiar o Partido Socialista nas lutas eleitorais para organizar passeios de propaganda e de lazer, desfiles socialistas etc.». Em maio de 1906, os membros da Unione organizaram um simpósio contra a tributação excessiva das bicicletas, e, em 3 de junho de 1907, em Carpi, realizou-se uma reunião de quase quinhentos ciclistas de Régio da Emília e Correggio (Giuntini).
Em Régio da Emília, os Ciclistas Vermelhos contaram quatro mil membros, divididos em esquadrões para cada fração de comuna, e distinguidos por um boné vermelho. Dois mil Ciclistas Vermelhos participaram do desfile de 1
ro de maio de 1906; dois dias antes, no domingo 29 de abril, houve uma reunião preparatória, que também foi um protesto contra o imposto sobre a circulação das bicicletas. O papel dos ciclistas era também proporcionar um serviço de ordem de rápido movimento para demonstrações e desfiles. Em junho de 1910, os Ciclistas Vermelhos organizaram um concurso de ciclismo floral. Numerosos passeios foram organizadas na província e, à frente dos esquadrões, sempre marchava a fanfarra do "Club Veloce" ("Clube Rápido"). A presença de ciclistas no desfile do 1ro de maio tornou-se habitual, não só em Régio da Emília, mas também nas cidades da província, como Correggio, Guastalla, Scandiano, Cavriago e Casoni (Fincardi, 2012b). Na Romanha houve uma competição animada entre os Ciclistas Vermelhos e as equipes de ciclismo republicanas e católicas (Ridolfi).

Os Ciclistas Vermelhos nos anos 1910
A constituição duma organização nacional de “Ciclisti Rossi” ("Ciclistas Vermelhos") foi apoiada por Giovanni Germanetto e Mario Montagnana, que mais tarde se tornaram lideres do Partido Comunista da Itália. Em 16 de junho de 1912, em Ímola o Congresso Socialista Regional, viu o nascimento dos "Ciclisti Rossi", uma sociedade esportiva que tinha objetivos sem dúvida políticos, em vez que desportivos. Naquele dia, setenta ciclistas vindos de Forlì com uma banda vermelha no braço chegaram ao congresso saudados por aplausos (Giannantoni e Paolucci) precedido de fanfarra e de sua bandeira social (Boschi). O jornal semanal "La Lotta" ("A Luta"), órgão da Federação Socialista de Ímola, na edição do mesmo dia, explicava: "Durante os períodos ocasionais de luta (eleições, agitações, greves, etc.), os Ciclistas Vermelhos vão permitir a nossos comitês ter meios seguros e rápidos de comunicação e correspondência, não só, mas eles irão fornecer-lhes um pessoal já disposto e preparado para viajar pelo município e a circunscrição eleitoral, com um conhecimento suficiente de lugares, pessoas, etc. Finalmente, nas grandes manifestações, o esquadrão dos Ciclistas Vermelhos - que, se o espírito e o entusiasmo de todos os camaradas ajudarão, sempre aumentará por número - vai completar dignamente nossos desfiles, coadjuvando eficazmente sua organização e dando-lhes maior ordem e imponência" (Fontana).
A revista socialista "L'Avanguardia" de 8 de setembro de 1912 apoiou a tese de usar os ciclistas vermelhos para fazer propaganda contra o esporte entre os jovens, em vez de fazer obstrução ao esporte
(Pivato, 1992).
No domingo, 22 de setembro de 1912, novamente em Ímola, em concomitância com o Congresso Nacional Juvenil Socialista, que realizou-se em Bolonha a partir da sexta-feira 20 de setembro, desenvolveu-se o primeiro Congresso Nacional dos Ciclistas Vermelhos
(Zanelli), com a presença de 700 Ciclistas Vermelhos de diversas regiões, principalmente do norte da Itália, enquanto Arturo Vella, Amedeo Bordiga e Anselmo Marabini pronunciaram um discurso (Fincardi, 2012b). Os participantes chegaram de Bolonha com um trem especial, fizeram uma parada em Piratello para homenagear o túmulo de Andrea Costa. Nascido em Ímola, 1851, Andrea Costa foi um dos fundadores do socialismo na Itália e o primeiro deputado socialista italiano e já tinha falecido em Ímola alguns anos antes, em 19 de janeiro de 1910. Os participantes do congresso se reuniram nas escolas Carducci, desfilaram pelas ruas de Ímola, foram levados para a prefeitura e visitaram as instituições trabalhistas e socialistas da cidade. De acordo com o espírito da reunião: "As bicicletas vermelhas querem servir nosso ideal, suster, conectar, manter sempre coeso nosso movimento, nossa gente em cada povoado" (Zanelli). Um periodista anônimo sobre o jornal "La lotta" expressou sua oposição à paixão pela bicicleta: "Faz muito tempo elevámos um protesto vigoroso contra a obsessão esportiva, que há algum tempo invadiu nossa juventude trabalhadora, distraindo-os de suas atividades da mente e da luta diária contra os privilégios" e ainda "a nossa é acima de tudo uma civilização espiritual. A educação física não deve prejudicar a educação intelectual" (Zanelli).
O jornal burguês Corriere della Sera deu uma interpretação negativa da conferência, vista como uma manifestação antimilitarista, resultando numa "séria briga na frente duma taberna freqüentada por nacionalistas"
(Boschi).
Em Régio da Emília em 1
ro de maio de 1913, os Ciclistas Vermelhos, depois de desfilarem pela cidade pela manhã, foram na tarde em Cavriago para realizar o boicote à celebração das associações católicas. O mesmo aconteceu no dia 1ro de maio do ano seguinte, em Quattro Castella (Fincardi, 2012b).
No mesmo ano de 1913, a revista de Lugo "La Fiamma Socialista" ("A Chama Socialista"), na ocasião da celebração de 1
ro de maio, escreveu: «Todos os Ciclistas Vermelhos de Lavezzola, Conselice, San Patrizio, Massalombarda, Giovecca, San Bernardino, Santa Maria di Fabriago e San Lorenzo irão a Sant'Agata sul Santerno, onde os Ciclistas Vermelhos de Villa San Martino e os de Lugo irão para encontrá-los para ir todos juntos em primeiro lugar na Casa dos organizadores vermelhos em Lugo, então ao monumento de Andrea Costa, para entregar as flores da memória e da promessa».
O terceiro desfile foi organizado em 22 de junho de 1913, como segundo Simpósio nacional dos grupos de ciclistas socialistas. Devido à tempestade de chuva, várias delegações de ciclistas, incluindo as de Turim, Veneza, Reggio e Lugo, tiveram que renunciar ao passeio, enquanto as delegações de Ímola e as outras que conseguiram chegar lá, esguichando na lama, foram capazes mesmo assim de ditar as regras do seu circuito organizacional.

Ímola viu, em 10 de agosto de 1913, a fundação da Federação Nacional de Ciclistas Vermelhos, com mais de mil membros e sede na via Appia, 7. Em 17 de agosto de 1913, a quarta reunião, apresentada como o Primeiro Simpósio Nacional, que fundou oficialmente a Federação dos Ciclistas Vermelhos, sendo a cidade da Romagna literalmente empapelada com cartazes e faixas com bandeiras vermelhas tremulando. A federação dos ciclistas vermelhos aconselhava vestir uma camisa vermelha com o emblema social e, à falta de camisa, uma braçadeira vermelha com uma escrita preta "equipe de ciclistas vermelhos de ..." (Pivato, 1992). Participaram mil ciclistas, com delegações de várias cidades da Romanha e Emilia. O semanário socialista local descreveu o encontro como "magnífico, imponente e entusiasmado". O jornal de FIGS (Federação Socialista Juvenil) «L’Avanguardia» conseguiu nessa altura apresentar a luta de classe em duas rodas: «Os ciclistas vermelhos são e serão a vanguarda da nossa propaganda e do nosso movimento, os trâmites rápidos pelos quais nossa gente de cada povoado e de cada país sempre ficar confiada e conectada, tanto em paz como em tempos de guerra».
Quando a Federação Nacional foi fundada, os Ciclistas Vermelhos eram difundidos principalmente na Emília, na Romagna, em Milão e Turim, mas existiram grupos relevantes em Pesaro, Florença, Sesto Fiorentino, Terni, Portici, Castellamare di Stabia e Sparanise, além de Città di Castello (vejam a ligação, em italiano), Régio da Emília, Ímola e Cesena, onde os esquadrões já existiram desde alguns anos
(Fincardi, 2012b).
Novamente, Ímola, em 24 de agosto de 1913, hospedou o primeiro Congresso Nacional dos Ciclistas Vermelhos, que aprovou um estatuto segundo o qual, em períodos especiais (eleições, agitações, greves), os Ciclistas Vermelhos deveriam assegurar uma comunicação e correspondência rápidas. O estatuto continuava definindo os Ciclistas Vermelhos como a vanguarda da propaganda e do movimento socialista e os meios pelos quais os afiliados de todos os povoados podem manter contato, tanto em paz como em guerra. A bicicleta era definida como o "veículo do povo" ao serviço da luta de classes, e o ciclismo agonístico era denegrido, definindo o esporte como um grave problema, que desviava a atenção dos trabalhadores e particularmente dos jovens, distraindo-os do estudo dos problemas sociais e mantendo-os afastados das associações políticas. Além disso foram reprovados todos os jovens que estavam mais ansiosos para ler o diário esportivo "La Gazzetta dello Sport" , em vez do diário socialista "Avanti!", e que cuidavam apenas de fazer amor e andar de bicicleta
(Izagirre).
Em Ímola, a Camera del Lavoro (escritório local do sindicato) abastecia serviços para ciclistas vermelhos, publicando em sua revista semanal "La Lotta", anúncios como esto: «Camaradas! Vocês precisam de pneus e câmaras de ar para bicicleta e vocês querem gastar pouco dinheiro? Dirijam-se para a Camera del Lavoro na via Gamberini. Mercadoria padrão a preços imbatíveis».

Programa dos Ciclistas Vermelhos
No documento constitutivo do novo movimento esportivo popular, escrito pelo ideólogo dos ciclistas vermelhos, Antonio Lorenzini, reportado num documento dactilografado inédito "Storia del ciclismo UISP" ("História do ciclismo UISP", a UISP é a União nacional de esportes populares) por Sergio Giuntini, se pode ler: «Os Ciclistas Vermelhos são aqueles que, mesmo sabendo e podendo andar de bicicleta, nunca fazem desse exercício, ou talvez desse tipo de paixão, nem uma meta nem um ideal. O objetivo dos Ciclistas Vermelhos é a propaganda: seu meio é o desporto de bicicleta, se você gosta de chamá-lo assim, contido em limites humanos e dignos! Nossos ciclistas não entendem e não querem que a educação física prejudique a educação intelectual e moral própria ou de outros.
No entanto, do esportes de bicicleta - e talvez amanhã de outros esportes - eles pura e simplesmente fazem um hábito higiênico, um passatempo e um meio apropriado e proporcional para defender e propagar em todos os lugares seus ideais civis, morais e políticos. Os Ciclistas Vermelhos ocasionalmente organizam um passeio para este ou aquele lugar no município, na circunscrição eleitoral, na província, ou talvez além das fronteiras da mesma província, na região, trazendo folhetos, jornais e o eco das primeiras discussões de propaganda miúda.
Durante os períodos extraordinários de luta (agitações, eleições, greves, congressos, reuniões, etc.), os Ciclistas Vermelhos vão assim permitir aos comitês executivos ou organizativos para ter meios seguros e rápidos de comunicação e correspondência, não só, mas eles vão proporcionar-lhes um pessoal já disposto e preparado para viajar pelo município, a circunscrição eleitoral ou a província com suficiente treinamento e conhecimento de lugares, pessoas e endereços.
Nas manifestações mais importantes, a equipe dos Ciclistas Vermelhos vai completar dignamente nossos desfiles, efetivamente coadjuvando sua organização e dando-lhes - sem preocupações sobre propaganda - maior ordem e imponência. Estes são os objetivos e as intenções que fizeram surgir as organizações dos Ciclistas Vermelhos, que, em vez de servir ... o interesse das empresas e das sociedades especuladoras, expressando desde seu seio, os heróis esbaforidos da bicicleta, querem, com a ginástica e a educação de seu corpo, servir uma ideia que vale mais que todas as Taças e todos os Grandes Prêmios dos grandes patriarcas e benfeitores do esporte de ... ganhar dinheiro. As bicicletas vermelhas - se os zelosos defensores do treinamento muscular para a glória e o maior poder das bolsas de valores capitalistas nos permitem - são e serão as vanguardas de nossa propaganda e de nosso movimento: os trâmites rápidos pelos quais nossas gentes de cada povoado e de cada aldeia sempre ficarão coesas e conectadas, tanto em tempo de paz quanto em tempo … de guerra
»
(Senatori, 2014).

Crescimento dos Ciclistas Vermelhos
Mesmo em 1914, por ocasião da revolta da «Semana Vermelha», entre 7 e 14 de junho, a bicicleta mostrou sua utilidade para a coleta e circulação de notícias, visto o isolamento devido à sabotagem de cabos telefônicos e telegráficos e ferrovias. Na ocasião, o escritor fascista de Forlì Antonio Beltramelli viu no uso da bicicleta para organizar a ocupação obreira da cidade, um novo meio do cerco posto pelo "campo" à "cidade" (Baroncini). O congresso da Juventude Socialista, programado para setembro de 1914 em Reggio Emilia, foi adiado devido à eclosão da guerra.
Os jornais socialistas publicavam a publicidade dos pneus
«Carlo Marx», apresentados como o «pneu dos socialistas italianos» e do «Ciclo Avanti!», cuja marca foi registrada em 18 de setembro de 1913 por Alcyon Officine, dos irmãos Cesarani de Caravaggio (província de Bergamo), que provavelmente foram os mesmos para publicar, no mesmo ano, o livro de Antonio Lorenzini. Um anúncio no "Avanti!" do verão de 1913 declarou: "Nenhuma bicicleta pode, por elegância, resistência, suavidade e barateza, ser comparada ao "Ciclo Avanti". Uma bicicleta destinada a se difundir rapidamente pela Itália, especialmente entre os trabalhadores" (Boschi).
Para fortalecer o espírito de pertença e reunir simpatizantes, a FNCR organizou em Ímola uma série de passeios de ciclismo de propaganda: o primeiro foi realizado em 8 de abril de 1917, dia da Páscoa, partindo às 13:00 da Ponte Santo, uma ponte sobre o rio Santerno, naquela época chamada pelos socialistas de Ímola "Ponte Rosso" ("Ponte Vermelha"). Uma filmagem deste passeio (vejam fotogramas 1, 2 e 3) foi publicada em 2010 em DVD por Bacchilega de Ímola, dirigida por Fausto Pullano com música de Roberto Bartoli. Inclui a versão restaurada com trilha sonora de duas filmagens de 1910 e 1913, mantidas em Ímola pelo CIDRA (Centro Imolese di Documentazione sulla Resistenza Antifascista e storia contemporanea - Centro Imolês de Documentação sobre a Resistência Anti-Fascista e História Contemporânea).
O segundo passeio foi organizado três domingos depois, no dia 29 de abril, partindo às 13:00 da mesma ponte, chegando após cerca de 20 km em San Patrizio, uma aldeia da vila de Conselice, na província de Rávena, onde foi realizada uma reunião pública, que terminou com a votação final duma ordem do dia. Em 13 de maio, os Ciclistas Vermelhos de Ímola, juntamente com os de Lugo, se reuniram em Mordano, na província de Bolonha, para o primeiro encontro entre duas circunscrições eleitorais e, em 20 de maio, organizaram um passeio de propaganda a Sesto Imolese. O último passeio de propaganda de 1917 foi em domingo 19 de agosto em Osteriola, onde os Ciclistas Vermelhos também se reuniram em 21 de julho de 1918 para uma reunião de circunscrição eleitoral.
O último sobrevivente dos Ciclistas Vermelhos de Imola foi Ottavio Zanelli (ligação), nascido em Rávena em 26 de setembro de 1904 e morto em 6 de abril de 2006 aos 101 anos de idade, após uma longa atividade política, do Congresso de Liorne de 1921 que viu a fundação do Partido Comunista da Itália, à detenção por sua oposição ao regime fascista, à Resistenza, até sua atividade política pós-guerra
(Giannantoni e Paolucci).

Os Ciclistas Vermelhos na década de 1920
O papel dos ciclistas vermelhos na década de 1920 foi importante na luta dos trabalhadores do primeiro pós-guerra, pelo emprego e contra o fascismo. Durante as greves, os Ciclistas Vermelhos ajudaram a formar rapidamente piquetes contra os fura-greves; na verdade, durante a greve agrária de agosto de 1920, o prefeito de Régio da Emília proibiu o uso de bicicletas em toda a província. Em 1921, uma equipe de Ciclistas Vermelhos de Régio da Emília acompanhou de Régio para Cavriago os corpos de dois trabalhadores mortos pelos fascistas em 1ro de maio (Fincardi, 2012b), e em Piombino (província de Liorne) em 3 de agosto de 1921, um esquadrão de Arditi del Popolo ciclistas (Arditi do Povo; os Arditi eram um corpo de elite) abriram a procissão fúnebre que acompanhava o corpo do obreiro Giuseppe Morelli, um membro dos Arditi del Popolo morto pelas forças de ordem pública. O jornal comunista L'Ordine Nuovo de 24 de julho de 1921, relatava os fatos de Cingía de Botti (província de Cremona), onde, em 17 de julho, seiscientos ciclistas vermelhos desfilaram pelas ruas da cidade, alinhados como soldados, para alcançar a sede local do partido fascista e fazer-se entregar o galhardete (Francescangeli). Na província de Veneza, em Cavarzere, um numeroso grupo de Arditi del Popolo, cerca de duzentos, espalhou-se entre as várias aldeias do município, mantendo contato entre eles por meio de estafetas ciclistas. Em Trieste, os Arditi Vermelhos, estabelecidos antes dos Arditi del Popolo, eram organizados em doze equipas, incluindo um esquadrão feminino e um de ciclistas. Os Ciclistas Vermelhos eram difundidos em Polesine, na província de Cremona e na Veneza Júlia (Francescangeli). Em Roma, os Arditi ciclistas cuidaram das conexões entre as unidades centrais e periféricas dos Arditi del Popolo e foram particularmente ativos na defesa de San Lorenzo e de outros bairros populares da agressão dos fascistas, que haviam chegado em Roma para participar do congresso de fundação do partido fascista, de 7 a 11 de novembro de 1921. Os Arditi ciclistas também conseguiram rapidamente mover homens de um bairro para outro, dependendo das necessidades criadas pelos ataques fascistas (Gentili).
O campeão de ciclismo Ottavio Bottecchia, vencedor de dois Tour de France, durante um dos quais ele vestiu a camisa amarela da primeira à última etapa, desenvolveu atividade antifascista e por isso foi assassinado em 1927.

Ciclistas Vermelhas (ou não)
A bicicleta também se tornou uma ferramenta para a emancipação feminina, graças, em particular, a algumas pioneiras que desafiaram o desprezo e os insultos dos conformistas. A presidenta da reunião feminista de Paris em 1896 propôs brindar a bicicleta "igualitária e niveladora". Os movimentos católicos achavam inadequado o uso da bicicleta e, portanto, de calças, pelas mulheres (Boschi). Como escreve Blom: «Os moralistas foram escandalizados pelo efeito que esses veículos anárquicos teriam tido na moral pública, sobretudo nas mulheres, que pedalavam alegremente, descartando seu corsete, vestindo roupa mais prática, inclusive calças. Enquanto isso, os cientistas alertavam gravemente que a pura velocidade, bem como a posição deles - audazmente escarranchadas no selim - estimulariam as mulheres além da sua resistência e as reduziriam a infertilidade, histeria ou pior, criaturas licenciosas e desenfreadas».

O Comitê Feminino da Federação de Ginástica de Roma, estabelecido em 1888, organizou competições de velocipedismo e excursões de bicicleta. As primeiras mulheres velocipedistas foram vistas em Milão em 1891, e em 1893 participaram em passeios e competições (em 1894 em Génova aconteceu a primeira corrida de ciclismo feminino na Itália) e participaram do desfile no encontro de ciclismo organizado em Ferrara em 1902 pelo Touring Club Italiano. Entre as mulheres ciclistas agonistas mais conhecidas, encontramos a futura cantora de ópera e atriz de teatro Lina Cavalieri, vencedora da corrida por etapas Roma-Turim, no final do século XIX, e a florista milanesa Adelina Vigo, que se desafiaram em 1893 em Milão, Alessandrina Maffi, campeã italiana de 1893 a 1897, que muitas vezes derrotou ciclistas do sexo masculino, como aconteceu no prémio de velocidade Audax de 1898, que ela venceu pedalando por 180 km em menos de 18 horas, Maria Forzani, vencedora da Milão-Varese em 1896, a belga Hélène Dutrieu (1877-1961) e Vittorina Sambri de Ferrara (1891-1965), que logo em seguida tornou-se piloto de motociclismo (Caracciolo, Gori). Contudo a mulher ciclista mais conhecida foi Alfonsina Morini Strada (1891-1959), de Modena, premiada pessoalmente pelo czar Nicolau II por sua participação no Grande Prêmio de Petersburgo de 1909. Morini participou de duas edições do Giro di Lombardia, em 1917 e em 1918, cruzando a linha de chegada, enquanto a metade dos competidores que tinham começado não terminaram Morini participou do Giro de Italia de 1924, com 90 competidores masculinos, onde terminou fora do tempo máximo em uma das últimas etapas, Áquila-Perúgia, também por causa das freqüentes paradas para dar autógrafos ao longo do caminho, mas foi autorizada pelos organizadores a participar até o final, mesmo que seus tempos não foram registrados. Alfonsina Morini também participou de outras edições do Giro d'Italia e ganhou 36 corridas, derrotando também competidores masculinos (Izagirre).
Depois da Segunda Guerra Mundial, as bicicletas desempenharam um papel fundamental nas lutas obreiras, de modo que os esquadrões especiais da polícia do Ministro do Interior, Mário Scelba, amiude as apreendiam ou destruíam. Milhares de bicicletas seguiram em 1949 o funeral de Maria Margotti, operária de Filo d'Argenta, morta por um policial
(Caracciolo).

Ciclistas Vermelhos na Europa
As organizações esportivas proletárias também existiram em outros países europeus; na última década do século, grupos de ciclistas socialistas foram formados na Áustria e na Suíça; em Leipzig, na Alemanha, em 1893, foi criado o Clube de Solidariedade dos Trabalhadores Ciclistas, logo proibido pelas leis antissocialistas, juntamente com associações similares de ginastas, nadadores, iatistas e atletas. Em fevereiro de 1894, em Birmingham, na Inglaterra, foi fundado o Socialists' Cycling Club (Clube de Ciclistas Socialistas), que depois tomou o nome de Clarion Cycling Club, desde o nome do jornal semanal socialista The Clarion. Em 1895, foi estabelecido o British Workers' Cycling Club (Wheeler).
Em 1896, em Offenbach am Main, na Alemanha, foi criada a Associação dos Ciclistas Vermelhos (ARS: Arbeiter-Radfahrerbund Solidarität - Associação de Trabalhadores Ciclistas Solidários) atualmente Rad- und Kraftfahrerbund Solidarität, que em 1912 tinha 150.000 membros. O jornal Arbeiter-Radfahrer, em 1913, declarou 168 mil exemplares. Em 1929 a associação tinha 320.000 membros e era o maior organização mundial de ciclismo, e também administrava uma fábrica cooperativa de bicicletas e organizava manifestações esportivas de propaganda. Na época da Primeira Guerra Mundial, as associações esportivas proletárias tinham mais de 350 mil membros.
Em 23 de junho de 1921, em Moscou, foi fundada a Red Sports International (Internacional Desportiva Vermelha), com representantes da Alemanha, França, Itália, Hungria, Checoslováquia, Suécia e Holanda, representando a ala revolucionária do movimento esportivo, oposta à Socialist Workers' Sport International
(Lucerne Sport International), fundada em 1920 em Lucerna, na Suíça, com inspiração reformista (Gounot).

Os ciclistas na Resistencia
Durante a Resistenza, como já mencionado antes, a bicicleta era usada como meio de conectar as bandas partidárias, mas também para realizar ações de guerra, escapar da polícia após dos comícios volantes extemporais nas cidades e para entregar armas, alimentos e material de propaganda. Isso envolveu muitas mulheres partidárias que arriscaram (e muitas vezes perderam) suas vidas para entregarem através de bicicletas, mensagens, alimentos e armas para as bandas rebeldes abrigadas nas montanhas (veja as fotos na linha acima, clique para ampliá-las).
O partidário Renato Romagnoli ("Italiano") em seu livro de 1974
«Gappista. Dodici mesi nella Settima Gap "Gianni"» («"Gappista" Doze meses na Séptima brigada Gap "Gianni"»), publicado por Vangelista, citado por Giannantoni e Paolucci, relata: «Em breve, todas as bicicletas se tornaram um pesadelo para os nazis e os fascistas, em todos os ciclistas viram um rebelde pronto para atirar nas tropas de ocupação, para atacar seus criados de camisa negra; as crônicas do tempo estão cheias de proclamações e editais sobre os usos permitidos e aqueles proibidos do popular meio de locomoção, nenhum fascista ou alemão, exceto aqueles em grupo, nunca teve coragem de parar um homem em bicicleta (e quando os inimigos agrupam-se são visíveis a partir de uma distância considerável e por isso torna-se fácil conseguir contorná-los). Editais e proclamações permaneceram ineficazes».
Por conseguinte, os fascistas em vários lugares proibiram o uso de bicicletas (vejam os editais de Carpi e de Bolonha). O mesmo livro de "Italiano" menciona algumas passagens de um edital publicado em Bolonha em 26 de abril de 1944:
«A partir de 26 de abril de 1944, é absolutamente proibido circular com bicicletas, até mesmo andando desmontados, dentro do perímetro da cidade de Bolonha cercado pelas avenidas (...). Aqueles que vivem dentro do perímetro acima descrito e que, por motivos de trabalho, têm de se mudar de bicicleta da área interditada para os subúrbios e, em seguida, voltar ao centro da cidade devem ter uma declaração especial de seu empregador, visada pela delegacia central de polícia de Bolonha, mas para todo o perímetro e as estradas proibidas terão que andar desmontados, desinflando os pneus das rodas ou desconectando a corrente da coroa e da catraca.
Uma proibição semelhante, com uma ameaça de execução sumária em caso de violação, é mencionada por "Italiano" referindo-se a Rávena. Em Milão e Turim, a mesma proibição não durou muito, já que a bicicleta era o único meio pelo qual os trabalhadores podiam alcançar às fábricas, que eram fundamentais para apoiar o esforço de guerra nazi-fascista.

Em Milão, a bicicleta foi fundamental para a realização de muitas ações de guerra partidária, e, em particular, se destacou Giovanni Pesce, com os nomes de batalha "Ivaldi" e "Visone", que realizou muitos atentados contra os fascistas graças a este veículo. Pesce explicou: «Era como o ar que eu respirava, um meio indispensável para avançar rapidamente em cada momento. Sem a bicicleta, não teria sido possível realizar as ações que realizei». Em 24 de abril de 1945, a ordem geral de insurreição foi entregada por estafetas ciclistas (Giannantoni e Paolucci).
Em Roma, durante os nove meses da ocupação nazista, a bicicleta foi usada para levar a cabo pelo menos dois grandes atentados, em 18 de dezembro de 1943 por Rosario Bentivegna, em frente ao cinema Barberini, na praça do mesmo nome, para atingir os participantes a uma projeção destinada aos soldados nazistas e em 26 de dezembro de 1943 em frente à casa de guarda da prisão de Regina Coeli, levado a cabo por Mario Fiorentini
(Portelli). Os atentados provocaram a proibição da circulação de bicicletas na cidade, que foi contornada, adicionando uma terceira roda ao veículo, transformando a bicicleta num triciclo.
O grande campeão ciclista florentino Gino Bartali
(1914-2000), explorando sua popularidade como campeão esportivo, utilizava sua bicicleta para esconder documentos falsos nos tubos do quadro, no guidão e na selim, que entregava a uns cidadãos judeus, que escondiam-se num convento de Frades Oblatos em Luca (cerca de 90 km de Florença) e Assis (160 km de Florença, onde foi 40 vezes), permitindo-lhes desta maneira sair como "arianos", salvando 4.000 deles do extermínio (Sbetti; Stevenson). Bartali disfarçava suas entregas como treinamento para se manter em forma, apesar da suspensão da atividade competitiva (o Giro d'Italia foi suspenso desde 1941), e quando era parado por controles, ele pedia para não tocar a bicicleta porque estava cuidadosamente calibrada para alcançar a velocidade máxima.
A polícia fascista manteve o campeão sob controle, mas não conseguia comprender por que ele costumava treinar por uma distância tão larga
(Stevenson). Bartali também escondeu a família judaica Goldenberg num porão da sua casa em Florença até a libertação da cidade em agosto de 1944 (Coen, Stevenson). Por esse motivo, após sua morte, Bartali foi galardoado pela Itália com a medalha de ouro póstuma ao mérito civil e por Israel com o título de "Justo entre as nações" e seu nome foi gravado no jardim do Yad Vashem. A atividade de Bartali era conhecida apenas por sua família e por aqueles que colaboraram com ele, e foi divulgada somente após sua morte, já que Gino não achava apropriado atribuir-se mérito disso: ele havia dito a seu filho Andrea: "Essas coisas se fazem, e isso é tudo".
O campeão ciclista de Varese Luigi Ganna, vencedor do primeiro Giro d'Italia em 1909, tornou-se um fabricante de bicicletas e, em 1944, doou dez de suas bicicletas para a 121a Brigada partidária Garibaldi "Walter Marcobi"
(Giannantoni e Paolucci). Também eram partidários Alfredo Martini (1921-2014) ciclista e em seguida, por 22 anos, seleccionador da equipe nacional italiana de ciclismo, Luciano Pezzi, ciclista e então diretor técnico de muitos campeões, entre eles Felice Gimondi e muitos outros atletas profissionais.

Ciclistas Vermelhos hoje
Nos anos mais recentes, a bicicleta reconquistou seu papel de estafeta obreira entre fábricas lutando contra os despedimentos ou o encerramento das fábricas. Em 2009, por ocasião do Giro d'Italia, trabalhadores precários ou recebendo subsídio de desemprego temporário do Vêneto e da Toscana levaram a cabo uma volta paralela entre as fábricas ocupadas pelos trabalhadores (Satta, 2009). Em 2013, os Socialistas da Romanha organizaram uma comemoração dos Ciclistas Vermelhos, por ocasião do centenário da fundação do movimento.
Em 25 de abril de 2015, para celebrar o 70mo Aniversário da Libertação e o papel dos Grupos de Defesa da Mulher na Resistenza, a secção de Modena da UDI (Unione Donne in Italia, União das Mulheres na Itália) de Modena, juntamente com a FIAB (Federazione Italiana Amici della Bicicletta, Federação Italiana de Amigos da Bicicleta), organizou um passeio de bicicleta nos lugares mais significativos da cidade para a história política da época
As Edições ZeroLire de Forlì publicam online diversas obras sobre na bicicleta e em sua vida social.

Me desculpo por qualquer falha na tradução portuguesa:
se você deseja comunicar comígo para correções e/ou comentários,
escreva-me

Bibliografia:
BARONCINI Enrico (2012) “Pedalanti eserciti”. La bicicletta nella “settimana rossa” romagnola. Em: Fincardi (editor), 2012 : 105-117.
BLOM Philipp (2012) The Vertigo Years: Change and Culture in the West, 1900-1914, Weidenfeld & Nicolson, London.
BOSCHI Massimiliano (2003) 1913, allarme a Imola. Arrivano i "ciclisti rossi". Il Venerdì di Repubblica, n. 784 (28 março 2003), pp. 51-52.
CAGNOLATI Antonella (editor) (2011) Donne e bicicletta : una relazione pericolosa? Aracne, Roma.
CARACCIOLO Carlos Hector (2011) Donne, uomini e biciclette. Appunti per una storia italiana. In Cagnolati, pag. 37-61.
CARNERO Roberto (2003) Anno 1900: Oriani e l'arte della bici. L'Unità, 22 abril 2003, pag. 16.
CAVALLARO Claudia (2017) Tra discriminazioni e dilettantismo: le cicliste che hanno fatto la storia in Italia. Soft Revolution, 24 maggio 2017
ligação
COEN Leonardo (2013) Bartali, cuore di campione così salvava gli ebrei. Repubblica Firenze, cronaca, 23 setembro 2013
ligação
DIRANI Ennio (1993) Cicloturismo romagnolo: 1894-1994 : per i cento anni della bicicletta di Oriani. A. Longo, Ravenna. Desde o site web: Edizioni ZeroLire
ligação
FINCARDI Marco (2012a) Il movimento dopo il lavoro. Em: Fincardi (editor), 2012: 5-14.
FINCARDI Marco (2012b) Ciclisti della Camera del Lavoro nel 1° maggio reggiano (1902-1922) Em: Fincardi (editor), 2012 : 189-210.
FINCARDI Marco (editor) (2012) Lo sport e il movimento operaio e socialista. L'Almanacco, Felina (RE), n. 59, junho 2012: 5-14.
ligação
FONTANA Gian Franco (1995) La bicicletta, Università aperta terza pagina, Imola (BO). (5), 11: 26-27.
FRANCESCANGELI Eros (2000) Arditi del Popolo. Odradek, Roma.
GENTILI Valerio (2009) La legione romana degli Arditi del Popolo. Purple Press, Roma.
GIANNANTONI Franco, PAOLUCCI Ibio (2008) La bicicletta nella Resistenza. Storie partigiane. Arterigere-Chiarotto Editore.
GIUNTNI Sergio (2012) “La Patria” socialista: una società ginnastica carpigiana dall’Ottocento al Fascismo. Em: Fincardi (editor), 2012 : 119-136.
ligação
GORETTI Leo (2012) “Sacrifici, sacrifici e ancora sacrifici” Sport, ideologia e virilità sulla stampa comunista (1945-1956 Em: Fincardi (editor), 2012 : 161-187.
GORI Gigliola (2011) Muliebris birota velocissima. Il ciclismo femminile in Italia fra XIX e XX secolo. Em : Cagnolati, pag. 63-88.
GOUNOT André (2001) Sport or Political Organization? Structures and Characteristics of the Red Sport International, 1921-1937. Journal of Sport History, vol. 28, n. 1, pagg. 23-39.
ligação
IZAGIRRE Andres (2015) ¿Por qué el ciclismo es una 'religión' en Italia? CNN Edición Español, 9 maio 2015 .
ligação
LA LOTTA (1917) Organo della Federazione collegiale socialista Imolese. 17, 19, 20.
LOMBROSO Cesare (1900) Il ciclismo nel delitto. Nuova Antologia di Lettere, Scienze ed Arti», vol. LXXXVI, IV serie, vol. CLXX. Roma,
ligação
LORENZINI Antonio (1913?) I ciclisti rossi: i loro scopi e la loro organizzazione. Fratelli Ceserani, Caravaggio.
PETRINI Giovanni (1904) Lo sport e la questione sociale. Avanguardia socialista, 1 maio 1904. Em Pivato, 1992: 227-230.
PIVATO Stefano (1992) La bicicletta e il sol dell'avvenire: sport e tempo libero nel socialismo della Belle époque. Ponte alle Grazie, Firenze.
PIVATO Stefano (2011) La rivoluzione silenziosa. Em: Cagnolati pag 15-20.
PIVATO Stefano, VERI Loretta, CANGI Natalia (editores) (2009) In bicicletta : memorie sull'Italia a due ruote. Il mulino, Bologna.
PORTELLI Alessandro (2012) L'ordine è già stato eseguito. Feltrinelli, Milano.
REGAZZONI Marco (2015) Tour de France 2015: i trionfi e lo strano incidente di Ottavio Bottecchia. www.oasport.it
ligação
RIDOLFI Maurizio (1993) Socialità popolare. Università aperta terza pagina, Imola (BO). (3), 6: 4.
S.A. (1921) L'inquadramento dei ciclisti rossi. L'Ordine Nuovo, 24 julho 1921, pag. 5,
ligação
SASSO Cinzia (2010) Dal campo di concentramento alla libertà la storia partigiana della 'staffetta' Sandra. Repubblica Milano, 26 novembro 2010
ligação
SATTA Andrea (2009) Ciclisti rossi cercasi. In bici tra gli operai. L'Unità, 24 maio 2009, pag. 43.
SATTA Andrea (2014) Libri nel Giro, Andrea Satta: "I ciclisti rossi". La Repubblica, Sport, 28 maio 2014
ligação
SBETTI Nicola (2015) Giochi diplomatici. Sport e politica estera nell'Italia del secondo dopoguerra (1943-1953). Tesis doctoral, Universidade de Bolonia.
ligação
SENATORI Luciano (2011) Associazionismo sportivo, proletario e popolare nell'Unità d'Italia. Stile Libero - Sport&Sicurezza, VIII, 2, mar-abr 2011, pag. 25-28
ligação
SENATORI Luciano (2014) Sport moderno e sport popolare. UISP Lega Pallavolo Nazionale - Corso per Formatori Giudici di Gara e Allenatori - Firenze 15 – 16 novembro 2014.
ligação
STEVENSON John (2013) Gino Bartali awarded Israel's Righteous Among The Nations for wartime activities. http://road.cc/, September 28 2013
ligação
TACCHINI Alvaro (s.a.) Lo sport: una "epidemia". Storia tifernate e altro.
ligação
TARANTINI Domenico (1975) La maniera forte : elogio della polizia : storia del potere politico in Italia, 1860-1975. Bertani, Verona. pag. 177.
WHEELER F. Robert (1978) Organized Sport and Organized Labour: The Worker's Sport Movment. Journal of Contemporary History, 13 (2): 191-210.
ligação.
ZANELLI Giuliana (2002) Ciclisti rossi. Università aperta terza pagina, Imola (BO). (12), 8: 10.
ZIBORDI Giovanni (1909) Sport, ginnastica e proletariato. Alla vigilia della discussione del disegno di legge per l'educazione fisica. Em "Avanti!" 18 novembro 1909. Em Pivato, 1992 255-261.

Sites web visitados:
ANPI Mirano ligação
Ciclo Imprese Estreme - Romagna - Bicicletta & Politica, 2 mayo 2014 ligação
Comune di Imola, Biblioteca Comunale di Imola. Pedalata dei ciclisti rossi a favore della propaganda socialista.
ligação
Federazione Giovanile Comunisti Italiani - Sezione "John Reed" Imola ligação
Formazioni di difesa proletaria, Wikipedia
ligação
I ciclisti rossi
ligação
Museum der Arbeit - Das Fahrrad ligação
Arquivo de l'Osservatore Romano ligação
Partito Socialista Italiano di Ravenna e della Romagna ligação
Storia e Memoria di Bologna - Ottavio Zanelli ligação
UDI - Io vado ... come una staffetta
ligação

página criada em: 4 de outubro de 2017 e modificada pela última vez em: 8 de agosto de 2024